30/10/2012

DOR

Dói em mim uma madrugada cansada
lateja ainda a dor
persistente
na vertigem nauseada que tenho no peito
no mesmo pedaço de pele
onde a tua mão sempre repousa
quando os pássaros esvoaçam e
respiramos o mesmo abraço.





                                                  
                                                                            

26/10/2012





ERA
Era uma certeza.
Ser capaz de mudar o mundo
apenas com o calor de uma vontade
ou a força de um desejo.
Mas isso era no tempo
em que o tempo não existia
ou que apenas media
a distância entre o que era
e o que seria
um dia.









23/10/2012


ORAÇÃO
Que este céu cinzento
denso e pesado
se desfaça agora numa tempestade de água fria
uma chuva forte
furiosa
que domine a poeira sufocante dos dias
e dilua as palavras das histórias sonhadas
e escritas em noites brancas.
E que esse dilúvio arraste todos os sonhos do mundo.
E que amanhã haja sol
para que o pobre pássaro que esvoaça agora
perdido e assustado
na escuridão
possa encontrar de novo
o ninho onde nasceu um dia.

James Whistler



21/10/2012

GOTA DE MEL
Tenho na mão uma gota de mel
que espalho na pele
quando me deito ao relento
sem dormir
à espera que uma carícia de vento
que não tarda a surgir
me revolva por dentro
e de dentro me leve
a doçura que ofereço à lua
que logo chega e me apazigua
com um raio de luar
para me aquecer o olhar
e de novo fazer vibrar
outra gota na palma da mão
gota de luar feito mel
doçura da noite espalhada na pele.









17/10/2012

DORME
Dorme Ivone.
Mesmo que não tenhas sono
fecha os olhos e enrola o corpo
faz-te leve e deixa-te voar.
E se alguém te perguntar porque dormes
Ivone
diz-lhe que aprendeste a dormir
para enganar a vontade de sonhar.










12/10/2012

UM DIA
Um dia não vais precisar de correr.
Não haverá urgência de chegar ou
pressa de partir.
Um dia tudo será tranquilo.
A vida deitada ao teu lado
e a doce certeza do amor
tão perto
deslizando na pele nua
do teu ombro
descoberto.

04/10/2012

PODES
Podes pintar de negro as flores de primavera
rasgar todas as cartas
queimar livros e recordações
podes fazer do mar um enorme deserto de sal
inventar palavras novas para dizer tristeza e saudade
podes abolir as manhãs de domingo
apagar do céu o brilho do luar
enganar a pele e dizer que é de frio
o arrepio que julgava de paixão
podes deixar de ser
e fazer com que tudo à tua volta
não seja e
não exista
podes fingir que é um jardim colorido
o monte de terra seca que te suja os sapatos
podes ficar ou partir
regressar ou permanecer
podes esperar ou desistir.
Podes fazer tudo aquilo que quiseres
podes mesmo não fazer abolutamente nada.
Só não podes apagar o amor.

 
 Nelleke Verhoeff