09/05/2012

UMA CASA 
Era um bairro de pequenas casas antigas, umas dez talvez. Impecavelmente restauradas, com telhados novos, paredes pintadas, madeiras limpas e metais polidos. Todas exibiam vaidosamente um pequeno jardim à frente, repleto de flores e relva cuidada onde, nos dias de calor, crianças barulhentas brincavam e cães ladravam. Tinham roupa lavada nos estendais, mulheres à janela, bicicletas encostadas, campainhas que tocavam, gente a entrar e a sair, todos os dias, a toda a hora.
Era um bairro bonito e convidativo, não fosse aquela casa... a casa mais triste do bairro. Tinha um aspecto desolado, com cortinas amarelecidas e esfarrapadas que lhe davam um olhar de animal abandonado. O rosto, onde se viam ainda ténues restos de azul claro, era marcado por fortes rugas de humidade e tinta descascada. O jardim era um amontoado de ervas daninhas e lixo de toda a espécie. Era uma casa parada e deprimida, incapaz de emocionar quem quer que fosse, mesmo aqueles que se detinham à sua frente, olhando-a e abanando a cabeça com ar reprovador. Era uma casa que assistia ao passar do tempo completamente imóvel, vazia de qualquer indício de vida. 
Numa noite de primavera, quando todas as casas tinham já adormecido, uma mão surgiu da escuridão, aproximou-se da casa triste, entrou por uma janela sem vidros e depositou um fósforo aceso no seu coração.

Sergio Membrillas

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