CHEIRO MOLHADO
Passou a tarde toda à chuva.
Atravessou a cidade de uma ponta à outra sem vergonha, sem impermeável e sem pressa de abrigo.
Sentia uma excitação desmedida, um prazer arrepiado com aquela carícia fria nos pedaços de pele nua. Parou num jardim, inspirou profundamente o cheiro molhado e quando o sentiu a correr nas veias, decidiu que era tempo de voltar para casa.
Só teve tempo de tirar as botas encharcadas... tinha na boca um sabor antigo e doce que a fez correr até ao quarto. Abriu a gaveta, vasculhou, revolveu, misturou e, por fim, encontrou-a. Estava dobrada e ligeiramente amachucada. Já não tinha a brancura e a juventude de outrora, mas até parecia mais bonita, com aquele tom amarelado. Ainda cheirava suavemente a jasmim.
Desdobrou-a, ficou um tempo a observa-la e começou a ler:
Meu querido,
esta é a primeira carta de amor que te escrevo.
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