03/09/2012

SOPRO MUDO
Pedes que te explique, mas juro que não sou capaz, não sei dizer tudo isto. É uma espécie de pulsar muito violento dentro de nós, entendes? Como se tivesses dois corações no peito (o teu e outro que te nasceu, sem dares conta), batendo desenfreadamente. Sentes um impulso inevitável de inspirar com toda a força, levar ao limite a capacidade de te encheres de ar e de mundo e depois, expirar lentamente, de olhos fechados, esperando que o ar que devolves à atmosfera venha carregado das palavras que queres dizer. Às vezes, assim acontece. E é uma festa, uma festa inigualável e perigosamente viciante. Voltas a ter apenas o teu coração de sempre e é o seu ritmo tranquilo que orienta o desenho das letras com que escreves o poema. Outras vezes, nada disso acontece. Expiras, e o que sai de ti é somente um sopro mudo, insípido e estéril, uma golfada de ar gélido e cinzento. Nessas alturas, podes desenhar as letras que quiseres, encher folhas e folhas de papel com palavras alinhadas em inúmeros textos desolados (como este). Mas nunca essas palavras terão o sabor da poesia.





2 comentários:

  1. Que bom estar de volta para encontrar bocadinhos de beleza por aqui.
    Que bom tornares este mundo mais bonito.
    Beijinho
    Isabel

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